Rosas na Bruma

Vinham rosas na bruma florescidas
rodear no teu nome a sua ausência.
E a si se coroavam, e tingiam
a apenas sombra de sua transparência.

Coroavam-se a si. Ou no teu nome
a mágoa que vestiam madrugava
até que a bruma dissipasse o bosque
e ambos surgissem só lugar de mágoa.

Mágoa não de antes ou de depois. Presente
sempre actual de cada bruma ou rosa,
relativos ou não no espelho ausente.

E ausente só porque, se não repousa,
é nome rodopio que, na mente,
em bruma a brisa em que se aviva a rosa.

 

Fernando Echevarría

Conversar

Em um poema leio:
Conversar é divino.
Mas os deuses não falam:
fazem, desfazem mundos
enquanto os homens falam.
Os deuses, sem palavras,
jogam jogos terríveis.

O espírito baixa
e desata as línguas
mas não diz palavra:
diz luz. A linguagem
pelo deus acesa,
é uma profecia
de chamas e um desplume
de sílabas queimadas:
cinza sem sentido.

A palavra do homem
é filha da morte.
Falamos porque somos
mortais: as palavras
não são signos, são anos.
Ao dizer o que dizem
os nomes que dizemos
dizem tempo: nos dizem,
somos nomes do tempo.
Conversar é humano.

 

Octavio Paz

O Único Amigo

Não me alcançarás, amigo.
Chegarás ansioso, louco.
Eu, porém, já terei ido.

(E que espantoso vazio
Tudo o que tenhas deixado
Atrás para vir comigo!
Que lamentável abismo
Tudo quanto eu haja posto
Em meio, sem culpa, amigo!)

Ficar não podes, amigo.
Voltarei talvez ao mundo.
Tu, porém, já terás ido.

Juan Ramón Jiménez

O Estudante

Sonha, sonha enquanto dormes.
Tudo esquecerás com o dia.

(Dia, alegre aprendizagem
Da grande sabedoria.)

Aprende, aprende. No sonho
Esquecerás o aprendido.

(Sonho, doce aprendizagem
Do definitivo olvido.)

Juan Ramón Jiménez

Eu não voltarei

Eu não voltarei. E a noite
morna, serena, calada,
adormecerá tudo, sob
sua lua solitária.

Meu corpo estará ausente,
e pela janela alta
entrará a brisa fresca
a perguntar por minha alma.

Ignoro se alguém me aguarda
de ausência tão prolongada,
ou beija a minha lembrança
entre carícias e lágrimas.

Mas haverá estrelas, flores
e suspiros e esperanças,
e amor nas alamedas,
sob a sombra das ramagens.

E tocará esse piano
como nesta noite plácida,
não havendo quem o escute,
a pensar, nesta varanda.

Juan Ramón Jiménez

Janela Sobre Uma Mulher

“Essa mulher é uma casa secreta. Em seus cantos, guarda vozes e esconde fantasmas.

Nas noites de inverno, jorra fumaça. Quem entra nela, dizem, não sai nunca mais.

Eu atravesso o fosso profundo que a rodeia.

Nessa casa serei habitado. Nela me espera o vinho que me beberá.

Muito suavemente bato na porta, e espero.”

Eduardo Galeano, As Palavras Andantes

No se trata de entender la vida

No se trata de entender la vida,
eso es lo menos importante.
Se trata de estar en el justo instante,
ni antes ni después,
que pasa por tu cuerpo
la clara sensación de vida por tus venas.

Tratar de entender la vida la complica,
mejor es dejarla llegar y acompañarla
y agradecer que tus ojos miran
a otros ojos que con ternura nos observan.

La vida es solo eso:
instantes y más instantes,
alegres, sombríos, tristes,
que no tienen que explicarse.

Guzmán Lavenant

Certezas

Não queres acreditar.
Não queres aceitar essa certeza.
Que se pode querer como te quero
sem pedir nada em troca, nada.

Não podes acreditar que isto existe
sem razão nenhuma num passado.
Não podes…
E eis que tudo é simples e complicado!

Sinto que te quero, não explico.
Não busco razão alguma no céu
nem nas distantes estrelas

ou em universos profundos ou infinitos.
Eu te desejo e a partir daí…
Tudo é possível.

Guzmán Lavenant

 

Esquecimento

A rua, as crianças, minhas lembranças:
ecos empedrados.
O jovem, a menina e quiçá uns beijos.
Os avós, os jardins e os cães.

Às vezes, céus cinzentos,
gritos e logo silêncios prolongados.
Como se tudo houvera terminado.
Ou seriam por acaso novos jogos

com crianças, avós, jardins e outros cães
e tudo segue, com novos passos
por essas ruas pavimentadas?

Talvez eu seja somente, no lugar,
um visitante estranho, velho e triste.
E essa rua, com o tempo, tenha me olvidado!

Guzmán Lavenant

Não sei quem é

É provável que venha de muito longe
não sei quem é nem a onde vai
é só uma mulher que morre de amor
nota-se em suas pétalas de lua
em sua paciência de algodão/ em seus
lábios sem beijos ou outras cicatrizes/
nos olhos de oliva e penitência

esta mulher que morre de amor
e chora protegida pela chuva
sabe que não é amada nem nos sonhos/
leva nas mãos suas carícias virgens
que não encontraram pele onde pousar/
e/ com o passar do tempo/ sua luxuria
derrama-se em um pote de cinzas.

Mario Benedetti

Tuas Mãos

Com tuas mãos eu sonho noite e dia, 

porque, com arte mágica e eloqüente, 

me souberam dizer, furtivamente, 

o que jamais tua boca me diria. 

Quisera ter meus lábios e desejos 

em tuas mãos, que são duas estrelas, 

e, em milagre de amor, senti-las, vê-las 

inteiramente presas por meus beijos. 

Mãos divinais que eu amo e prezo tanto; 

mãos de luz e de seda, que meu canto 

há de imortalizar! Ó mãos gloriosas! 

De vós um grande bem quero esperar: 

cerrai meus olhos, lindas mãos piedosas, 

no momento em que a morte me chegar! 

Ovídio Fernández Rios 

Poeta uruguaio (1882-1963) 

Eros é a água

Entre as tuas pernas
o mar revela-me estranhos recifes
rochas erguidas corais altaneiros
contra a minha gruta de búzios concha nácar

o teu molusco de sal persegue a corrente
a pequena água inventa-me barbatanas
mar da noite com luas submersas

tua ondulação brusca de polvo congestionado
acelera nas minhas guelras um latejar de esponja
e os cavalos minúsculos flutuam entre gemidos
enredados em longos pistilos de medusa.

Amor entre golfinhos
aos altos lança-te sobre o meu flanco leve
recebo-te sem ruído olho-te entre bolhas
cerco o teu riso com a minha boca espuma
ligeireza da água oxigênio de tua vegetação de clorofila
a coroa de lua abre espaço ao oceano.

Dos olhos prateados
flui longo olhar final
e erguemo-nos do corpo aquático
somos carne outra vez
uma mulher e um homem
entre as rochas.

Gioconda Belli

Poema 55, quinta poesia vertical

Um amor mais além do amor
Por cima do rito do vínculo
Mais além do jogo sinistro
Da solidão e a companhia

Um amor que não necessite regresso
Porém tampouco partida
Um amor não submetido
As chamas de ir e de voltar

De estar despertos ou dormidos
De chamar ou calar
Um amor para estar juntos
Ou para não está-lo

Porém também para todas as posições intermediárias
Um amor como abrir os olhos
E talvez também como fechá-los.

Roberto Juarroz

Poema de Amor

O sol nos esqueceu ontem sobre a areia,
nos envolveu o rumor suave do mar,
teu corpo me deu calor,
tinha frio,
e ali na areia,
entre os dois nasceu este poema,
este pobre poema de amor
para ti

Meu fruto, minha flor,
minha história de amor,
minhas carícias

Meu humilde candeeiro,
minha chuva de abril,
minha avareza

Meu pedaço de pão,
meu velho refrão,
meu poeta

A fé que perdi,
meu caminho
e minha carreta

Meu doce prazer,
meu sonho de ontem,
minha bagagem

Meu morno canto,
Minha melhor canção,
minha paisagem

Meu manancial,
meu canavial,
minha riqueza

Minha lenha, minha lareira,
meu teto, meu lar,
minha nobreza

Minha fonte, minha sede,
meu barco, minha rede
e a areia

Onde te senti
onde te escrevi
meu poema.

Joan Manoel Serrat

Te quero

Tuas mãos são minha carícia
Meus acordes cotidianos
Te quero porque tuas mãos
Trabalham pela justiça

Se te quero é porque tu és
Meu amor, meu cúmplice e tudo
E na rua lado a lado
Somos muito mais que dois

Teus olhos são meu conjuro
Contra a má jornada
Te quero por teu olhar
Que olha e semeia futuro

Tua boca que é tua e minha
Tua boca não se equivoca
Te quero porque tua boca
Sabe gritar rebeldia

Se te quero é porque tu és
Meu amor, meu cúmplice e tudo
E na rua lado a lado
Somos muito mais que dois

E por teu rosto sincero
E teu passo vagabundo
E teu pranto pelo mundo
Porque és povo te quero

E porque o amor não é auréola
Nem cândida moral
E porque somos casal
Que sabe que não está só

Te quero em meu paraíso
E dizer que em meu país
As pessoas vivem felizes
Embora não tenham permissão

Se te quero é porque tu és
Meu amor, meu cúmplice e tudo
E na rua lado a lado
Somos muito mais que dois.

Mario Benedetti

POEMA VERTICAL

La vida comunica con una parte de la muerte
quizá con un muerto.
El sueño comunica con tus manos
quizá con una sola.

La noche comunica con el gesto
quizá con un lenguaje de vísceras inmóviles.
El aire comunica con la página
eterna de los diarios
quizá con la idea y su respiración clandestina.

La nada comunica con la nada
quizá con el pez de esta palabra sin mar.
Pero hay algo entreverado en todo esto,
algo parecido a lo triste
tal vez a sus bordes,
que ni siquiera se comunica
con su propio y olvidado ser.

Es como apagar una luz
con los ojos cerrados.
Y quizá menos todavía:
palabras escritas
en un papal del color de la palabra.

Roberto Juarroz

 

Um espaço

Um espaço
não pode apagar outro,
mas pode escanteá-lo.
Também os espaços ocupam um lugar,
em outra dimensão que é mais que espaço.
Há espaços com uma só voz,
espaços com muitas vozes
e até espaços sem nenhuma,
mas todo espaço está só,
mais só que aquilo que contém.
Ainda que todo espaço
se confunda ao fim com todo espaço.
Ainda que todo espaço
seja um jogo impossível,
porque nada cabe em nada.

Roberto Juarroz

 

Credo Poético

Piensa el sentimento, siente el pensamiento;
que tus cantos tengan nidos en la tierra,
y que cuando en vuelo a los cielos suban
tras las nubes no se pierdan.

Peso necesitam, en las alas peso,
la columna de humo se disipa entera,
algo que no es musica es la poesia,
la pensada sólo queda.

Lo pensado es, no lo dudes, lo sentido.
Sentimento puro? Quien ello crea,
de la fuente del sentir nunca ha llegado
a la viva y honda vena

No te cuides en exceso del ropaje,
de escultor y no de sastre es tu tarea,
no te olvides de que nunca más hermosa
que desnuda está la idea.

No el que un alma encarna en carne, ten presente,
no el que forma da a la idea es el poeta,
sino que el que alma encuentra tras la carne,
tras la forma encuentra idea.

Miguel de Unamuno

Palavras

Palavras? Sim. De ar

e perdidas no ar.

Deixa que eu me perca entre palavras,

deixa que eu seja o ar entre esses lábios,

um sopro erramundo sem contornos,

breve aroma que no ar se desvanece.

Também a luz em si mesma se perde.

 

Octavio Paz

A imensa alegria de servir

Toda natureza é um desejo de serviço.
Serve a nuvem, serve o vento, serve o sulco.
Onde houver uma árvore para plantar,
planta-a tu;
onde houver um erro para corrigir,
corrige-o tu;
onde houver uma tarefa que todos recusem,
aceita-a tu.

Sê quem tira
a pedra do caminho,
o ódio dos corações
e as dificuldades dos problemas.

Há a alegria de ser sincero e de ser justo;
há, porém, mais do que isso,
a imensa alegria de servir.

Como seria triste o mundo
se tudo já estivesse feito,
se não houvesse uma roseira para plantar,
uma iniciativa para lutar!

Não te seduzam as obras fáceis.
É belo fazer tudo
que os outros se recusam a executar.

Não cometas, porém, o erro
de pensar que só tem merecimento executar
as grandes obras;
há pequenos préstimos que são bons serviços:
enfeitar uma mesa.
arrumar uns livros.
pentear uma criança.

Aquele é quem critica,
este é quem destrói;
sê tu quem serve.

Servir não é próprio dos seres inferiores:
Deus, que nos dá fruto e luz,
serve.
Poderia chamar-se: o Servidor.
E tem os seus olhos fixos nas nossas mãos
e pergunta-nos todos os dias:
– Serviste hoje?

Gabriela Mistral, poetisa chilena (1889-1957)

A veces me parece

A veces me parece

que estamos en el centro

de la fiesta

sin embargo

en el centro de la fiesta

no hay nadie

En el centro de la fiesta

está el vacío

Pero en el centro del vacío

hay otra fiesta.

 

Roberto Juarroz

Ahuyentemos el tiempo, amor,

Ahuyentemos el tiempo, amor,
que ya no exista;
esos minutos largos que desfilan pesados
cuando no estás conmigo
y estás en todas partes
sin estar pero estando.

Me dolés en el cuerpo,
me acariciás el pelo
y no estás
y estás cerca,
te siento levantarte
desde el aire llenarme
pero estoy sola, amor,
y este estarte viendo
sin que estés,
me hace sentirme a veces
como una leona herida,
me retuerzo
doy vueltas
te busco
y no estás
y estás
allí
tan cerca.

Gioconda Belli

Te Quiero

Tus manos son mi caricia
mis acordes cotidianos
te quiero porque tus manos
trabajan por la justicia

si te quiero es porque sos
mi amor mi cómplice y todo
y en la calle codo a codo
somos mucho más que dos

tus ojos son mi conjuro
contra la mala jornada
te quiero por tu mirada
que mira y siembra futuro

tu boca que es tuya y mía
tu boca no se equivoca
te quiero porque tu boca
sabe gritar rebeldía

si te quiero es porque sos
mi amor mi ccómplice y todo
y en la calle codo a codo
somos mucho más que dos

y por tu rostro sincero
y tu paso vagabundo
y tu llanto por el mundo
porque sos pueblo te quiero

y porque amor no es aureola
ni cándida moraleja
y porque somos pareja
que sabe que no está sola

te quiero en mi paraíso
es decir que en mi país
la gente vive feliz
aunque no tenga permiso

si te quiero es porque sos
mi amor mi ccómplice y todo
y en la calle codo a codo
somos mucho mas que dos.

Mario Benedetti

Vento, Água, Pedra

A água perfura a pedra,
o vento dispersa a água,
a pedra detém ao vento.
Água, vento, pedra.

O vento esculpe a pedra,
a pedra é taça da água,
a água escapa e é vento.
Pedra, vento, água.

O vento em seus giros canta,
a água ao andar murmura,
a pedra imóvel se cala.
Vento, água, pedra.

Um é outro e é nenhum:
entre seus nomes vazios
passam e se desvanecem.
Água, pedra, vento.

Octavio Paz

Algún día encontraré una palabra

Algún día encontraré una palabra
que penetre en tu vientre y lo fecunde,
que se pare en tu seno
como una mano abierta y cerrada al mismo tiempo.

Hallaré una palabra
que detenga tu cuerpo y lo dé vuelta,
que contenga tu cuerpo
y abra tus ojos como un dios sin nubes
y te use tu saliva
y te doble las piernas.
Tú tal vez no la escuches
o tal vez no la comprendas.
No será necesario.
Irá por tu interior como una rueda
recorriéndote al fin de punta a punta,
mujer mía y no mía
y no se detendrá ni cuando mueras.

Roberto Juarroz

Los portadores de sueños

En todas las profecías
está escrita la destrucción del mundo.
Todas las profecías cuentan
que el hombre creará su propia destrucción.
Pero los siglos y la vida
que siempre se renueva
engendraron también una generación
de amadores y soñadores;
hombres y mujeres que no soñaron
con la destrucción del mundo,
sino con la construcción del mundo
de las mariposas y los ruiseñores.

Desde pequeños venían marcados por el amor.
detrás de su apariencia cotidiana
guardaban la ternura y el sol de medianoche.
Las madres los encontraban llorando
por un pájaro muerto
y más tarde también los encontraron a muchos
muertos como pájaros.
Estos seres cohabitaron con mujeres traslúcidas
y las dejaron preñadas de miel y de hijos verdecidos
por un invierno de caricias.

Así fue como proliferaron en el mundo los portadores sueños,
atacados ferozmente por los portadores de profecías
habladoras de catástrofes.
Los llamaron ilusos, románticos, pensadores de utopías
dijeron que sus palabras eran viejas
y, en efecto, lo eran porque la memoria del paraíso
es antigua al corazón del hombre.

Los acumuladores de riquezas les temían
lanzaban sus ejércitos contra ellos,
pero los portadores de sueños todas las noches
hacían el amor
y seguía brotando su semilla del vientre de ellas
que no sólo portaban sueños sino que los
multiplicaban y los hacían correr y hablar.
De esta forma el mundo engendró de nuevo su vida
como también había engendrado…

Gioconda Belli

Credo Poético

Piensa el sentimento, siente el pensamiento;
que tus cantos tengan nidos en la tierra,
y que cuando en vuelo a los cielos suban
tras las nubes no se pierdan.

Peso necesitam, en las alas peso,
la columna de humo se disipa entera,
algo que no es musica es la poesia,
la pensada sólo queda.

Lo pensado es, no lo dudes, lo sentido.
Sentimento puro? Quien ello crea,
de la fuente del sentir nunca ha llegado
a la viva y honda vena

No te cuides en exceso del ropaje,
de escultor y no de sastre es tu tarea,
no te olvides de que nunca más hermosa
que desnuda está la idea.

No el que un alma encarna en carne, ten presente,
no el que forma da a la idea es el poeta,
sino que el que alma encuentra tras la carne,
tras la forma encuentra idea.

Miguel de Unamuno

Um poema

Hoje dói-me pensar,
dói-me a mão com que escrevo,
dói-me a palavra que ontem disse
e também a que não disse,
dói-me o mundo.
Há dias que são como espaços preparados
para que tudo doa.
Só deus não me dói hoje.
Será porque hoje ele não existe?

Roberto Juarroz

 

 

Um espaço

Um espaço
não pode apagar outro,
mas pode escanteá-lo.
Também os espaços ocupam um lugar,
em outra dimensão que é mais que espaço.
Há espaços com uma só voz,
espaços com muitas vozes
e até espaços sem nenhuma,
mas todo espaço está só,
mais só que aquilo que contém.
Ainda que todo espaço
se confunda ao fim com todo espaço.
Ainda que todo espaço
seja um jogo impossível,
porque nada cabe em nada.

Roberto Juarroz

 

 

Hice un fuego del color de la palabra

1

Madre del tiempo,
tú me has visto llorar de memoria
cuando aún no era.
Madre del tiempo,
tráeme la mirada desnuda del amado,
tráeme la mano de viento del amado,
tráeme su sexo de madera colérica,
tráeme su piel de sonidos de tambores.
Madre del tiempo,
tráeme la flor incendiada
que crece en la lengua de la muerte.

2

Perfectamente triste
para besar la boca inútil de la muerte,
lloro ante los sueños rotos
que me separan de las cosas.

3

He amado tanto
que ya no soy del amor.
Pero he sido niña.
Tan sólo por eso
debieran considerarme.

4

Ser la soñadora en su camisa azul
que ama la tierra extraña
o atreverse como la náufraga
que vuelve al mar
porque nadie se alegra
de su salvación.

ALEJANDRA PIZARNIK ( Argentina )

Um Poema

Toda a palavra chama outra palavra.
Toda a palavra é um íman verbal,
um pólo de atracção variável
que inaugura sempre novas constelações.

Uma palavra é toda a linguagem,
mas é também a fundação
de todas as transgressões da linguagem,
a base onde se afirma sempre uma antilinguagem.

Uma palavra é ainda o homem.
Duas palavras são já o abismo.
Uma palavra pode abrir uma porta.
Duas palavras fazem-na desaparecer.

Roberto Juarroz

Duodécima Poesia Vertical

Podría quizá olvidar algo que he escrito
y volver a escribirlo de la misma manera.
Podría olvidar la vida que he vivido
y volver a vivirla de la misma manera.
Podría olvidar la muerte que moriré mañana
y volver a morirla de la misma manera.
Pero siempre hay un grano de polvo de la luz
que rompe el engranaje de las repeticiones:
podría olvidar algo que he amado
pero no volver a amarlo de la misma manera.

 

Poderia talvez esquecer algo que escrevi
e voltar a escrevê-lo da mesma maneira.
Poderia talvez esquecer a vida que vivi
e voltar a vivê-la da mesma maneira.
Poderia esquecer a morte que morrerei amanhã
e voltar a morrê-la da mesma maneira.
Mas há sempre um grão de pó de luz
que rompe a engrenagem das repetições:
poderia esquecer algo que amei
Mas não voltar a ama-lo da mesma maneira.

 

Roberto Juarroz

Rendição

Depois de ter cortado todos os braços que se estendiam para mim;

Depois de ter entaipado todas as janelas e todas as portas;

Depois de ter inundado os fossos com água envenenada;

Depois de ter edificado minha casa num rochedo inacessível aos afagos e ao medo;

Depois de ter lançado punhados de silêncio e monossílabos de desprezo a meus amores;

Depois de ter esquecido meu nome e o nome da minha terra natal;

Depois de me ter condenado a perpétua espera e a solidão perpétua,

ouvi contra as pedras de meu calabouço de silogismos a investida húmida, terna, insistente, da Primavera.

Octávio Paz

No nos dejaremos arrebatar la paz

 

No dormireis, malditos de la espada,
cuervos nocturnos de sangrientas uñas,
tristes cobardes de las sombras tristes,
violadores de muertos.

No dormireis.

Su noble canto, su pasión abierta,
su estatura más alta que las cumbres,
con el cántico libre de su pueblo
os ahogarán un día.

No dormireis.

Venid a ver su casa asesinada,
la miseria fecal de vuestro odio,
su inmenso corazón pisoteado,
su pura mano herida.

No dormireis.

No dormireis porque ninguno duerme.
No dormireis porque su luz os ciega.
No dormireis porque la muerte es solo
vuestra victoria.

No dormireis jamás porque estais muertos.

Rafael Alberti
 

VENTO, ÁGUA, PEDRA

A água perfura a pedra,
o vento dispersa a água,
a pedra detém ao vento.
Água, vento, pedra.

O vento esculpe a pedra,
a pedra é taça da água,
a água escapa e é vento.
Pedra, vento, água.

O vento em seus giros canta,
a água ao andar murmura,
a pedra imóvel se cala.
Vento, água, pedra.

Um é outro e é nenhum:
entre seus nomes vazios
passam e se desvanecem.
Água, pedra, vento.

 

Octavio Paz

A CARÊNCIA

A CARÊNCIA

 

Não sei sobre pássaros,

não conheço a história do fogo.

Mas creio que minha solidão deveria ter asas.

 

 

LA CARENCIA

 

Yo no sé de pájaros,

no conozco la historia del fuego.

Pero creo que mi soledad debería tener alas.

 


Alejandra Pizarnik

De Las Aventuras Perdidas (1958)


 

Escrito com tinta verde

A tinta verde cria jardins, selvas, prados,
folhagens onde gorjeiam letras,
palavras que são árvores,
frases de verdes constelações.

Deixa que minhas palavras, ó branca, desçam e te cubram
como uma chuva de folhas a um campo de neve,
como a hera à estátua,
como a tinta a esta página.

Braços, cintura, colo, seios,
fronte pura como o mar,
nuca de bosque no outono,
dentes que mordem um talo de grama.

Teu corpo se constela de signos verdes,
renovos num corpo de árvore.
Não te importe tanta miúda cicatriz luminosa:
olha o céu e sua verde tatuagem de estrelas.

 

Octavio Paz

Mar Ínsipido

El mar de tan insípido es inmenso
no tiene corazón ni abrecaminos
cual saliva de dios inexplicable
viene y se va sin entregarnos nada
el mar opaco o transparente crece
o decrece en el lecho de su hondura
señor de los naufragios deja cuerpos
en las islas que esperan su legado
a sus olas sin sol no las conmueve
ni la sirena fiel de copenhague
el mar no es un puñal / son mil puñales
que acaban con los viejos pescadores
no sabe perdonar / su ley de siempre
es que el pez grande ha de comerse al chico
nosotros pasaremos pero el mar
quedará como sábana y testigo


Mario Benedetti

 

Epitafio

Aquí el valor de la española tierra,
aquí la flor de la francesa gente,
aquí quien concordó lo diferente,
de oliva coronando aquella guerra;

aquí en pequeño espacio veis se encierra
nuestro claro lucero de occidente;
aquí yace enterrada la excelente
causa que nuestro bien todo destierra.

Mirad quién es el mundo y su pujanza,
y cómo, de la más alegre vida,
la muerte lleva siempre la victoria;

también mirad la bienaventuranza
que goza nuestra reina esclarecida
en el eterno reino de la gloria.

 

Miguel de Cervantes

Cultivo uma rosa branca

Cultivo uma rosa branca,
em julho como em janeiro,
para o amigo verdadeiro
que me dá sua mão franca.

E para o cruel que me arranca
o coração com que vivo,
cardo, urtiga não cultivo:
cultivo uma rosa branca.

 

Jose Marti

Corazón Coraza

Porque te tengo y no
porque te pienso
porque la noche está de ojos abiertos
porque la noche pasa y digo amor
porque has venido a recoger tu imagen
y eres mejor que todas tus imágenes
porque eres linda desde el pie hasta el alma
porque eres buena desde el alma a mí
porque te escondes dulce en el orgullo
pequeña y dulce
corazón coraza

porque eres mía
porque no eres mía
porque te miro y muero
y peor que muero
si no te miro amor
si no te miro

porque tú siempre existes dondequiera
pero existes mejor donde te quiero
porque tu boca es sangre
y tienes frío
tengo que amarte amor
tengo que amarte
aunque esta herida duela como dos
aunque te busque y no te encuentre
y aunque
la noche pase y yo te tenga
y no.

 

Mario Benedetti

 

 

 

 

Coração Couraça
Porque te tenho e não
porque te penso
porque a noite está de olhos abertos
porque a noite passa e digo amor
porque vieste recolher a tua imagem
e és melhor que todas as tuas imagens
porque és linda dos pés à alma
porque és boa da alma a mim
porque te escondes doce no orgulho
pequena e doce
coração couraça

porque és minha
porque não és minha
porque te olho e morro
e mais que morro
se não te olho amor
se não te olho

porque tu existes sempre em qualquer parte
mas existes melhor onde te quero
porque a tua boca é sangue
e tens frio
tenho que amar-te amor
tenho que amar-te
ainda que esta ferida doa como duas
ainda que te procure e não te encontre
e ainda que
a noite passe e eu te tenha
e não.

Ya No Quiero

CXXXIII

Ya no quiera más bien que sólo amaros,
ni más vida, Lucinda, que ofreceros
la que me dais, cuando merezco veros,
ni ver más luz que vuestros ojos claros.

Para vivir me basta desearos,
para ser venturoso, conoceros,
para admirar el mundo, engrandeceros,
y para ser Eróstrato, abrasaros,

La pluma y lengua, respondiendo a coros,
quieren al cielo espléndido subiros,
donde están los espíritus más puros;

que entre tales riquezas y tesoros,
mis lágrimas, mis versos, mis suspiros,
de olvido y tiempo vivirán seguros.

 

Lope de Vega

Um despertar

 

Estava emparedado dentro de um sonho,
Seus muros não tinham consistência
Nem peso: seu vazio era seu peso.
Os muros eram horas e as horas
Fixo e acumulado pesar.
O tempo dessas horas não era tempo.

Saltei por uma fenda: às quatro
Deste mundo. O quarto era meu quarto
E em cada coisa estava meu fantasma.
Eu não estava. Olhei pela janela:
Sob a luz elétrica nem uma viva alma.
Reflexos na vela, neve suja,
Casas e carros adormecidos, a insônia
De uma lâmpada, o carvalho que fala solitário,
O vento e suas navalhas, a escritura
Das constelações, ilegíveis.

Em si mesmas as coisas se abismavam
E meus olhos de carne as viam
Oprimidas de estar, realidades
Despojadas de seus nomes. Meus dois olhos
Eram almas penadas pelo mundo.
Na rua vazia a presença
Passava sem passar, desvanecida
Em suas formas, fixa em suas mudanças,
E em volta casas, carvalhos, neve, tempo.
Vida e morte fluíam confundidas.

Olhar desabitado, a presença
Com os olhos de nada me fitava:
Véu de reflexos sobre precipícios.
Olhei para dentro: o quarto era meu quarto
E eu não estava. A ele nada falta
          – sempre fiel a si, jamais o mesmo –
ainda que nós já não estejamos… Fora
contudo indecisas, claridades:
a Alba entre confusos telhados.
E as constelações que se apagavam.

 

Octavio Paz

Um Poema de amor para domingo II

Igual que vosotros

 

Desesperadamente busco y busco
Un algo, que sé yo qué, misterioso,
Capaz de comprender esta agonía
Que me hiela, no sé con qué, los ojos.

Desesperadamente, despertando
Sombras que yacen, muertos que conozco,
Simas de sueño, busco y busco un algo,
Qué se yo dónde, si supieseis cómo.

A veces, me figuro que ya siento,
Que sé yo qué, que lo alzo y lo toco,
Que tiene corazón y que está vivo,
No sé en qué sangre o red, como un pez rojo.

Desesperadamente, le retengo,
Cierro el puño, apretando el aire sólo…
Desesperadamente, sigo y sigo
Buscando, sin saber por qué, en lo hondo.

He levantado piedras frías, faldas
Tibias, rosas azules, de otros tonos,
Y allí no había más que sombra y miedo,
No sé de qué, y un hueco silencioso.

Alcé la frente al cielo: lo miré
Y me quedé, ¡Por qué, oh Dios!, dudoso:
Dudando entre quien sabe, si supiera
Qué sé yo qué, de nada ya y de todo.

Desesperadamente, esa es la cosa.
Cada vez más sin causa y más absorto
Qué sé yo qué, sin qué, oh Dios, buscando
Lo mismo, igual, oh hombres, que vosotros.

 

Blas de Otero