Mar desconhecido

Sinto viver em mim um mar ignoto,
E ouço, nas horas calmas e serenas,
As águas que murmuram, como em prece,
Estranhas orações intraduzíveis.

Ouço também, do mar desconhecido,
Nos instantes inquietos e terríveis,
Dos ventos o guaiar desesperado
E os soluços das ondas agoniadas.

Sinto viver em mim um mar de sombras,
Mas tão rico de vida e de harmonias,
Que dele sei nascer a misteriosa

Musica, que se espalha nos meus versos,
Essa música errante como os ventos,
Cujas asas no mar geram tormentas.

Augusto Frederico Schmidt

Solombra

Eu sou essa pessoa a quem o vento chama,
a que não se recusa a esse final convite,
em máquinas de adeus, sem tentação de volta.

Todo horizonte é um vasto sopro de incerteza.
Eu sou essa pessoa a quem o vento leva:
já de horizontes libertada, mas sozinha.

Se a Beleza sonhada é maior que a vivente,
dizei-me: não quereis ou não sabeis ser sonho?
Eu sou essa pessoa a quem o vento rasga.

Pelos mundos do vento, em meus cílios guardadas
vão as medidas que separam os abraços.
Eu sou essa pessoa a quem o vento ensina:

“Agora és livre, se ainda recordas.”

 

Cecilia Meireles